#145. Coisa de rico
Olá,
Às vezes gosto de lavar louça ouvindo podcast. (Eu já escrevi isto? Lembro-me vagamente de ter escrito algo parecido. Espero que não.) O problema é que sempre tenho mais louça para lavar que podcast para ouvir, o que me leva com frequência à aba “Explorar” do aplicativo de podcasts, o que é sempre uma incursão deprimente devido à limitação imaginativa do que se produz, ou do que o app exibe ali.
Com base nessa amostragem, posso dizer com segurança que todos os podcasts do mundo cabem em cinco gêneros:
- Reportagens de jornalistas que só outros jornalistas e crackudos de notícias ouvem.
- True crime, que são reportagens que mais gente além de jornalistas ouve.
- Entrevistas.
- Pessoa doida falando sozinha. (O meu é um desses.)
- Duas ou mais pessoas doidas conversando aos berros.
A infinidade de títulos pode passar a impressão de há farta oferta para cada perfil de ouvinte. Ledo engano. A abundância de podcasts proporcionada por Spotify e YouTube é tal como a de todo latifúndio, grandes volumes de pouca diversidade.
Se abstrairmos um pouco a classificação, aliás, dá para reduzir os podcasts a duas categorias:
- Gente sabe do que está falando, porém chata.
- Gente que não tem a menor ideia do que está falando e, ainda por cima, é chata.
Faz algumas dias voltei a ouvir a rádio enquanto esfrego pratos e talheres. Seria ótimo não fosse a quantidade insalubre de anúncios.
Talvez devêssemos comprar uma lava-louças. #
Li o livro “Coisa de rico” (Todavia), do Michel Alcoforado, porque ele está em todos os podcasts de entrevista e o assunto exerce um estranho fascínio em mim. (Acho que a riqueza material devia ser proibida.)
O livro é só um amontoado de anedotas tendo o próprio Michel (ou melhor, o “antropólogo do luxo”, seu alter-ego) como protagonista, por vezes se confundindo com os ricos que se propõe a avacalhar, digo, observar, o que me passou uma energia um tanto egocêntrica do autor.
Michel segmenta os ricos brasileiros em dois grupos: o dos “novos ricos” ou emergentes (espalhafatosos, mal educados) e os do dinheiro velho (discretos, “quiet luxury”, preconceituosos). Como se fossem muito diferentes no que importa, né? E mesmo nesse jogo dos sete erros, achei o texto confuso na tentativa de distinguir os dois grupos e até mesmo de defini-los.
Por ser assinado por um antropólogo, esperava que o livro focasse mais ou igualmente no “porquê” dos ricos serem como são em vez de só no “como”. Porque o “como” a gente já meio que sabe e o livro confirma: a vida dos endinheirados, pois, é uma grande sala VIP de aeroporto com outras disputas inócuas passivo-agressivas além das clássicas quem tem o melhor cartão de crédito e quem fez a viagem mais legal.
Minha sugestão? Ouça uma das entrevistas que o Michel deu a todos os podcasts brasileiros no último mês. Ele sintetiza as partes mais interessantes, o que te poupará o tempo que seria despendido na leitura.
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Ouvi a entrevista do Michel ao Marcelo Tas e quase perdi a atenção em vários momentos porque o Tas fica gemendo o tempo todo…? “Sim, hmmm, é, sim…” Estranho. #
Algumas coisas que publiquei no Manual do Usuário:
- O computador da família.
- Folha de S.Paulo pede indenização de R$ 23.400 ao Manual do Usuário por ferramenta que democratiza a informação.
- “Pix das mensagens”, ou um plano para destronar o WhatsApp no Brasil.
- Revisitando o Facebook.
- Meu mouse preferido custa menos de R$ 40.
Descobri que o site Tecmundo tem um podcast chamado “Sem Manual”. Um nome correto porque o meu site, Manual do Usuário, não tem qualquer participação no referido programa.
“Porque ninguém lê, mas a gente explica” (o slogan do “Sem Manual”) magoou um pouco, porém. #
Fui ao cinema (!) assistir ao filme “A hora do mal”, do Zach Cregger. Tinha visto algumas chamadas super positivas (evito ler críticas antes de ver um filme), notas altas de público e crítica, parecia não ter erro, só que achei o filme… bobo.
Depois fiquei pensando se o problema não era eu, ou seja, se não bato com filmes de terror. Procurei algumas listas de melhores filmes do gênero e tem alguns de que gosto muito, como “O iluminado”, os do Jordan Peele (“Nós”, “Corra”), “O massacre da serra elétrica” (o original), o primeiro “Halloween”, “A bruxa de Blair”… tem muitos filmes bons. Jamais colocaria esse “A hora do medo” no mesmo patamar desses.
(Descobri também, depois, que o filme é do mesmo diretor de “Noites brutais”, que também é bem mais ou menos. Tivesse atentado a isso antes, acho que não teria ido ao cinema.) #
Ao contrário de outros principais que usavam perucas anacrônicas e botões de esmeralda, o marquês vestia roupas de algodão e barrete branco. Entretanto, comparecia por obrigação aos atos públicos, porque nunca pôde vencer o horror à vida social.
— Gabriel García Márquez, “Do amor e outros demônios”. #